Adega dos Lombinhos
Como uma puta que não beija na boca, na Adega dos Lombinhos não servem café.
Esquisitices de prostituta que não quer ser amante em adega que não quer ser restaurante. Na Adega dos Lombinhos, o nome é a coisa.
A Adega é uma adega, com vinho tinto, branco e verde, traçadinhos e copos-de-três, verde tinto frio e outras receitas para uma boa dor de cabeça; uma adega que abre às sete da manhã, que a sede e a fome de quem trabalha madrugam. E é uma adega dos lombinhos, de porco claro, feitos na chapa, à vista do respeitável público, em dose inteira, ou meia, ou no pão. Sempre suculentos apesar de finos, temperados antes, nunca duros ou ressequidos. E com batatas fritas, das verdadeiras, muito bem feitas, que apetece comer sempre com a mão, da travessa. Batatas que são "batatinhas", sempre no ponto de fritura correcto, e podem vir mais "se desejar".
É claro que há mais na Adega para lá dos lombinhos. Há sobretudo bacalhau. Cozido, posta em cunha, bem escolhida e bem demolhada, de lasca untada, com grão manteiga, muito bem cozido, e pires de inox bipartido com cebola de um lado e salsa picada do outro, para temperar a gosto, com os dedos, como quem semeia. Também pode ser assado, o bacalhau. E aqui vê-se que o cozinheiro não andou, como os seus homólogos dos grelhadores ali da Baixa, na escola de hotelaria do crematório do cemitério dos Olivais. Também há chocos frescos com tinta, muita e muito preta, a saber ao mar, do qual a Adega é abrigo (Lisboa ainda é muito um intervalo de mar). A batata cozida que vem com os chocos, que podia ser melhor, parece gostar muito de se tingir, como uma gorda a banhos de lama num spa.Com doze lugares, três empregados e muitas vezes o dono na casa, comer na Adega tem algo de exclusividade. Bom atendimento e uns mimos do pessoal desde o senhor do babete (e do arroto) ao casal de advogados excêntrico,. Tudo sob o olhar maternal e o sorriso bonito seco de sol e sal que vai lavando os pratos, tão distinto (e deslocado?).E na sobremesa, uma total liberdade de escolha entre gelatina e fruta. Nada de mousses de mangas ou sericaias – é o estilo Small is beauti da Rua dos Douradores. E para quê doces-doces se tão doce é o melão, bem escolhido, de certeza apertado por mãos sabedoras até dar aquele estalinho? A gelatina, com travo a canela, enquanto derrete na boca, permite saborear o balcão, sempre movimentado, com faquires de filetes de bacalhau e ovos cozido, e o ar que rescende da mistura de pronúncias. É que estamos na Baixa, esse imenso Portugal dos Pequenitos, onde toda a gente veio de não sei onde. Vieram para trabalhar, mas querem continuar a comer a comida lá da terra.
Uma pessoa "a sério"
Há 14 anos
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